Túlio Almeida – Psicólogo Clínico na Samec, Mestrando no PPGNEIM/UFBA, especialista em saúde mental coletiva pela Faculdade Ruy Barbosa e Terapeuta Comunitário (UFC)
O suicídio é um problema de saúde pública que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. No Brasil, segundo os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 14 mil pessoas ceifam suas próprias vidas, por ano, em média. Porém, um dado chama atenção nas pesquisas sobre masculinidades: os homens são as maiores vítimas por suicídio: cerca de 4 vezes mais, em comparação às mulheres. Esse recorte de gênero, em grande parte, possui uma relação direta com o processo de socialização dos homens. (OMS, 2025)
De acordo com Valeska Zanello (2018), o aprendizado de ser homem começa na infância: nos espaços sociais, na escola, nos filmes, nas redes sociais, mas principalmente entre seus pares. Em nossa cultura, essa aprendizagem se faz na imposição de ter que competir com o outro, de ser o melhor, ser o provedor, embrutecer o corpo e não demonstrar as suas fragilidades. Desde a infância, os meninos são ensinados a partir de um ideal hegemônico de virilidade, no qual se deve suprimir a expressão de certas emoções, como o choro e a tristeza. Tais emoções são repudiadas na configuração das masculinidades, por ainda serem interpretadas como um comportamento tipicamente feminino, ou seja, “coisa de mulher”.
As frases mais comuns que os meninos escutam em seu processo de socialização, são: “seja homem”, “engole o choro” ou “homem que é homem não chora”. Essa aprendizagem social, aparentemente inofensiva, ensina aos meninos e os homens a não compartilharem seus medos, suas dores. Essa aprendizagem social, que, muitas vezes, são naturalizadas, contribuem consideravelmente na resistência dos homens a procurarem tratamento psicológico, por medo de serem julgados como “fracos” ou se sentirem ameaçados em sua identidade masculina. O isolamento social, a pressão para serem provedores e o peso de um modelo de masculinidade rígida intensificam ainda mais essa vulnerabilidade. Somado a isso, quando tentam tirar a própria vida, costumam recorrer a métodos mais letais, o que resulta em maior taxa de mortalidade (Albuquerque, 2023).
É fundamental compreender que o suicídio entre homens não é sinal de fraqueza individual; mas é um fenômeno estrutural. O suicídio entre homens é resultado, em grande parte, de uma cultura que desautoriza os homens, desde a infância, a compartilharem suas emoções, seus medos, suas dificuldades, que são legítimas e profundamente humanas. Para mudar esse cenário, precisamos pensar e organizar campanhas de conscientização que levem em consideração essa aprendizagem social, que é ultrapassada, mas está enraizada em nossa cultura. Precisamos de políticas públicas e campanhas direcionadas aos homens, no que se refere ao cuidado em saúde mental, espaços de diálogos, rodas de conversa e a importância de se buscar ajuda psicológica. Afinal, homem que é homem também cuida de si.
REFERÊNCIAS:
ALBUQUERQUE, F. Homens, Masculinidades e Saúde Mental. 1ª ed. Curitiba/PR: Editora Appris, 2023.
ORGANIZAÇAO MUNDIAL DA SAÚDE. Suicídio, disponível: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/suicide; 25 de março de 2025
ZANELLO, V. FIUZA, G. COSTA, H. S. Saúde mental e gênero: facetas gendradas do sofrimento psíquico. Fractal, Rev. Psicol, Rio de Janeiro, v.27, n.3, p.238-246, Dec. 2015.
ZANELLO, V. Saúde Mental, Gênero e Dispositivo: Cultura e Processos de Subjetivação. 1. ed. Curitiba: Appris, 2018a.